Com um violão nas mãos, o estudante Gabriel Rodrigues da Silva dedilha as primeiras notas de uma canção e escreve o próprio destino. Com 13 anos, ele é morador de Mandacaru e convive ao lado de garotos da mesma idade que já estão envolvidos com as drogas. O local é um dos bairros com alto índice de violência em João Pessoa e convive até com a presença de facções criminosas.
“Eu sempre falo para meus amigos não usarem essas coisas (drogas). Digo para eles irem para a escola e estudar para terem um futuro melhor. É isso o que minha mãe sempre fala para mim. Quando crescer, quero ser um músico”, conta o garoto.
Ao lado de outras 64 crianças, Gabriel assiste aulas de música oferecidas gratuitamente por policiais militares e moradores da região. A iniciativa partiu do porteiro José Severino da Silva, ao perceber que as crianças do local estavam tendo influências pela presença de criminosos.
“Eu não sou músico, mas gosto de música. Decidi criar um curso de música. Com ajuda de amigos, compramos alguns instrumentos e chamamos um músico da Banda da PM para dar as aulas”, contou Severino.
Ações como a de Severino têm a finalidade de evitar o envolvimento de crianças com facções criminosas e evitar o crescimento de estatísticas que eram quase inexistentes na Paraíba até algumas décadas atrás. Segundo o Sistema de Informação de Mortalidade (SIM), da Secretaria de Estado da Saúde (SES), o número de homicídios contra crianças está crescendo na Paraíba.
Desde 1999 até setembro de 2012, já houve 255 registros dessa natureza envolvendo pessoas com menos de 14 anos. Os dados mostram que as mortes estão aumentando de forma gradativa, ano após ano. Em 1999, foram sete casos. Em 2000, essa quantidade subiu para onze registros e a situação foi se agravando à medida que os anos foram se passando até alcançar a marca de 35 homicídios em 2011. Só em 2012, já foram 21 ocorrências.
Uma das causas dessa mortalidade envolvendo crianças é a influência que as facções criminosas exercem sobre elas. Em João Pessoa, existem, pelo menos, dois grupos comandados por traficantes e que são rivais. Eles se autodenominam de “Al-Qaeda” e “Estados Unidos”. Em ambos, já existe a presença de menores de 12 anos e que estão sendo recrutados para atuar como “aviãozinhos” em bairros periféricos de João Pessoa. A informação é de investigações realizadas pelo 5º Batalhão de Polícia Militar da Paraíba.
O comandante da unidade militar, tenente-coronel Lívio Delgado, explica que o termo “aviãozinho” é dado a pessoas que transportam drogas, levando do traficante ao usuário, sem chamar a atenção da polícia. “Os bandidos colocam as crianças para fazer esse trabalho, porque sabem que isso dificulta o nosso trabalho. Como as crianças têm acesso fácil a escolas e às comunidades onde moram, fica mais fácil para elas fazerem esse trajeto e fica mais difícil para os policiais identificarem e impedirem o tráfico”, disse.
“Envolvidas com o tráfico, as crianças ficam mais vulneráveis a se tornarem usuários de drogas e até de serem assassinadas, porque, qualquer deslize que elas cometerem, pagam com a vida”, alerta o oficial.
Para agravar ainda mais a situação, as crianças também estão ingressando mais cedo nas facções criminosas. O comandante do 5º Batalhão da Polícia Militar acrescenta que a “Al-Qaeda” atua em diversos bairros da cidade, comandando o tráfico de drogas e executando homicídios.
Entre os locais comandados pelos criminosos, estão Mandacaru (onde o grupo Al- Qaeda divide o tráfico com os Estados Unidos). Além desse local, os grupos estão presentes nos bairro dos Novais, Valentina, Mangabeira, Ernani Satyro, Costa e Silva e Grotão, segundo a PM.
Nathielle Ferreira
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